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quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Conhecimento ? para que? Da um trabaaaaalho


Um bom artigo, comentem, 

Na tradição judaico-cristã, que herdamos, o saber e o conhecer estão sob o manto da maldição, desde nossas origens míticas. Nos mitos e provérbios, ditos e ensinamentos, conhecer e saber é estar condenado a uma vida ruim, perdida e louca. 
No
 Eclesiastes, no mito adâmico e em muitos outros documentos teológicos, vemos se repetir a mesma receita: evite saber ou conhecer.

Qual o fundamento disso? Por que isso se dá dessa forma? Por que viver em sociedade, significa colocar sob suspeita o ‘saber/conhecer’? Qual a natureza desse poder, ou dessa maldição?
 

A herança de tal complexo histórico-cultural tem produzido efeitos nocivos sobre a estrutura do saber e do conhecer em nossas sociedades ocidentais; especialmente na América Latina e no Mundo Ibérico.

No Cristianismo, mais especificamente, temos a condenação fatal de Eva, e de toda a espécie, após a queda da
 Primeira de Todas, ao morder a maçã da Árvore do Conhecimento; guardada por uma serpente. A partir desse momento, conhecer/saber, significará, para todo sempre, trabalhar e produzir para se sustentar. É o fim do Paraíso! Então, logo, ‘saber/conhecer’ tem o peso e paga-se o preço do ter que lutar e trabalhar pelo pão nosso de cada dia. 

Pelo contrário, não saber/conhecer teria a ‘grande vantagem’ de não demandar ‘trabalho’ e não estar condenado a labuta do dia a dia.

Curiosa equação instalada no nosso inconsciente social: conhecer/saber = trabalho. Ou seja: não saber/conhecer = fluência paradisíaca. É assim que significamos o conhecimento e a sabedoria, algo que dá trabalho e leva a perda do paraíso e da inocência.
 

No caso do
 Eclesiastes conhecer/saber leva, conduz, à loucura. Ignorar, não saber/conhecer, estar sob o véu da ‘santa ignorância’ é melhor, é mais calmo, é mais certo. Pois, se Deus conduz todas as coisas; se Deus é onipresente-ciente-potente, o Demiurgo, para quê saber/conhecer como se constitui o mundo, suas leis, lógicas, etc? Isso fica para os Gregos, que não entendemos, pois 'falam grego'... Ou os Árabes, que guerreamos...

E assim se funda desde cedo nossa relação com o conhecimento e a sabedoria: - Menino(a), não estude muito! Vai acabar doido! Estudar demais acaba nisso: loucura! Como lembra Roberto da Matta, entre nós, se vemos uma criança lendo um livro, logo a colocamos para brincar com as outras crianças, pois ler é estar só! Estar só, entre nós, é estar triste. Portanto, ler é = solidão = mal.

Essa equação significativa tem um poder hipnótico incrivelmente contagiante. De tal sorte que saber/conhecer significa sofrer e deixar de viver ‘naturalmente’, ‘inconscientemente’; o que significaria, aí, viver melhor, não sabendo, não conhecendo... Não saber/conhecer que forças atuam sobre nossa subjetividade e a forma de nós pensarmos, nossos valores, nossos sentimentos, nossas crenças... Tem um ‘alto’ ganho abrir mão do saber/conhecer entre nós. É o ganho da ilusão, da auto-ilusão, da alienação, da conciliação, dos usos e abusos dos outros. Não conhecer/saber das coisas é a chave para ser usado, explorado, empregado e subir na vida. Como cantou Chico Buarque: vence na vida quem diz sim! Isso é que é valioso entre nós.

O preço de saber/conhecer, de revelar a lógica da cultura dominante que nos formou e forma, é ter que ‘trabalhar’, lutar pelo sustento, inventar sua própria vida. Em nossa 'cultura', estudar e conhecer/saber leva a pessoa a ser crítica, revoltada, rebelde, estranho, solitário, problemático, esquisito, etc.

'Conhece-te a ti mesmo', lema dos filósofos gregos, causa desconfortos demais! Para Sartre, o que é mais valioso na vida consiste em saber/conhecer o que devemos fazer do que fizeram de nós! Essas máximas passam longe da formação geral das nossas novas gerações! Ensinamos que o melhor é não saber nada! Como o nosso Presidente recentemente disse! Melhor, então, é meditar e orar!

Essa estrutura de sentimentos e preconceitos em relação ao saber/conhecer não se dá apenas entre classes sociais e grupos de baixa escolaridade. Surpreendentemente, pela força das ideologias, esse processo de evitação do ‘esclarecimento’, essa fobia da autonomia reflexiva, se dá em todas as classes e grupos de interesse e poder. Saber/conhecer é poderoso e arriscado. E até mesmo em Academias e em Universidades elaborar consciência reflexiva e autônoma é perigoso e causa suspeita.
 

No que tange a subjetividade, fechar os olhos para o que atua nas pessoas e grupos e aceitar o jogo da reprodução dos interesses do capital simbólico em disputa é a coisa mais sensata a se fazer. Juntar as peças do saber e do conhecer pode ser muito arriscado e temeroso; pode ter conseqüências fatais: a perda do emprego... o isolamento social... a desconfiança...

A maldição do conhecimento parece que é constituinte e atravessa todas as formas de dominação. Como se libertar dessa maldição é o segredo de todo trabalho de autonomização, num mundo predominantemente heterônomo.
Postado por Alexandre Correa 

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